A amigos, Temer disse que enviou a carta para não precisar se encontrar pessoalmente com a presidente Dilma e ser vítima novamente de uma “arapuca” armada pelos ministros que tentam associá-lo à defesa do governo contra o impeachment. Apesar do tom duro, peemedebistas dizem que a carta não significa ainda um rompimento. Mas é quase isso.
O vice-presidente conversou com o GLOBO e mostrou-se incomodado com a divulgação da carta.
— Escrevi uma carta confidencial e pessoal à presidente da República. Tive o cuidado de mandar pessoalmente a minha chefe de gabinete entregá-la. Mais uma vez avaliei mal. Desembarquei em Brasília agora à noite e me surpreendi com o fato gravíssimo de o palácio ter divulgado uma carta confidencial. Eu já tinha me decepcionado quando os ministros Edinho Silva (Comunicação Social) e Jaques Wagner (Casa Civil) divulgaram versões equivocadas do meu último encontro com a presidente, me deixando mal jurídica e politicamente.
Segundo o vice-presidente, Jaques Wagner divulgou a informação errônea de que ele não via lastro jurídico no impeachment. Temer disse que a decisão de Cunha tem lastro jurídico.
— Eu havia sido comunicado pelo Eduardo Cunha que ele acolheria o pedido de impeachment. Reconheci seu direito de fazê-lo e depois o ministro Jaques Wagner colocou na minha boca a afirmação de que a decisão não tinha lastro jurídico. Constrangido, tive que desmenti-lo. O acolhimento tem sim lastro jurídico.
O vice-presidente enviou a mensagem antes de embarcar em São Paulo em um jatinho da FAB para Brasília. Apesar de Dilma ter dito à imprensa que tem confiança integral em Temer e que ele sempre lhe foi fiel, a desconfiança clara por parte da petista vem desde o início de agosto, quando Temer pregou o surgimento de “alguém” capaz de unificar o país.
— Não tem jeito. Ele vai ser chamado de conspirador o tempo todo. Então, ao fazer a carta, ele quer mostrar que sempre colaborou, sempre ajudou o governo. E queria demonstrar que ela (Dilma) nunca demostrou essa confiança em todos esses episódios — explica um interlocutor do vice-presidente.
UM ROSÁRIO DE LAMENTAÇÕES
Na carta, Temer enumera uma série de motivos que demonstram que ele nunca recebeu a confiança da presidente. O rosário de problemas vinha desde a escolha de seu nome para vice na chapa presidencial, em 2010, e seria exposto na próxima conversa privada entre os dois. Ontem à tarde, no entanto, reunido com o ex-ministro Moreira Franco, o vice desistiu do encontro privado e resolveu enviar o texto.
O texto se inicia com uma citação em latim — Verba volant, scripta manent — que significa “As palavras voam, mas o escrito fica”. O vice-presidente explica então que escreve um “desabafo que já deveria ter feito há muito tempo”.
Em uma série de mensagens publicadas em uma rede social da vice-presidência, horas após o envio da carta, a assessoria do vice-presidente disse que Temer enviou carta em caráter pessoal, não lhe deu publicidade e “em face da confidencialidade, surpreendeu-se com sua divulgação”. A assessoria faz então esclarecimentos:
“Diante da informação de que a presidente o procuraria para conversar, Michel Temer resolveu apontar por escrito fatores reveladores da desconfiança que o governo tem em relação a ele e ao PMDB. Ele rememorou fatos ocorridos nestes últimos cinco anos mas somente sob a ótica da debate da confiança que deve permear a relação entre agentes públicos responsáveis pelo país”.
Segundo a vice-presidência, não se trata de uma ruptura, mas de uma defesa da “reunificação” do país:
“Não propôs rompimento entre partidos ou com o governo. Exortou, pelo contrário, a reunificação do país, como já o tem feito em pronunciamentos anteriores. E manterá a discussão pessoal privada no campo privado”.
Horas antes de embarcar para Brasília, o vice-presidente apresentou em São Paulo a uma plateia de cerca de 150 empresários o programa de governo formulado pelo PMDB para que o Brasil saia da crise. Em um evento mensal da Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio) para o qual já estava convidado antes da deflagração do impeachment, Temer falou por cerca de meia hora sobre as propostas de “Uma ponte para o Futuro”. Procurado, o Palácio do Planalto não qui se manifestar sobre a carta de Temer.
Fonte: EXTRA