Mais de 1,4 mil mortes por crimes violentos já foram registrados no
Ceará este ano. O dado, da Secretaria da Segurança Pública e Defesa
Social (SSPDS), conta até abril, data das últimas medições, e segue a
tendência média do número de vítimas de homicídios, latrocínios e lesões
corporais seguidas de morte de 2014.
O crescimento nesses crimes
no Ceará é superior à média nacional. Causas para isso, entretanto, são
interpretadas de várias formas, conforme a corrente ideológica. De
acordo com o posicionamento político, a legislação sobre compra e posse
de armas de fogo é apontada como fator agravante ou atenuante para a
violência.
Em outubro, completa-se uma década do referendo sobre a
venda de armas de fogo no território brasileiro, que era parte prevista
pelo Estatuto do Desarmamento, de 2003. Desde então, os resultados são
objeto de interpretações divergentes.
Divulgado na semana
passada, o Mapa da Violência, documento do Governo Federal em parceria
com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco), mostrou que o Ceará teve 3.161 mortes por armas de
fogo em 2012 (último ano da pesquisa). O número é 287,9% maior que 10
anos antes, às vésperas da implantação do Estatuto.
O estudo,
entretanto, aponta que o Brasil teria 160 mil mortes a mais que as que
aconteceram desde 2002 se seguisse a tendência da década anterior. Não
há especificação por estado.
O motivo para a desaceleração,
aponta a medição, teriam sido as restrições de compra e uso de armas. O
número nacional de homicídios chegou, em 2012, a 40.077, quando a
previsão do Mapa era de 71.118. Entre maio e dezembro de 2013, o
Instituto Doutor José Frota (IJF), realizou 2.084 atendimentos de
pacientes com “perfuração por arma de fogo”. A contagem é mais que o
dobro das mil registradas em 2003.
Ciclo interrompido
Secretária
nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, Regina Miki
comemora o que o Mapa da Violência aponta como um crescimento 70,7%
menor das mortes por armas de fogo no Brasil, o que ela caracteriza como
“estagnação”. “Isso interrompe um ciclo que poderia ser muito pior”. De
acordo com ela, atualmente, o arsenal bélico registrado no País chega a
nove milhões. Dos crimes, ela aponta, 85% são cometidos com armas
nacionais. Por isso, afirma a secretária, é imprescindível o
enfrentamento do mercado clandestino, assim como do controle das
fronteiras.
Revogação
Desde a implantação
do estatuto, a comercialização de armas de fogo diminuiu em torno de
90%, aponta o deputado Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC). “Se a arma do
cidadão de bem era a responsável pela criminalidade, nós teríamos a
diminuição dela. O que vimos foi o contrário”. Peninha é o autor do
projeto de lei 3.722/2012, que coloca novas regras para a aquisição,
posse, porte e circulação de armas de fogo e munições. Na prática, seria
feita a revogação do Estatuto.
O deputado afirma que a nova
legislação cumpriria, de fato, o que o referendo escolheu, e daria mais
“liberdade” à população. “Quem quer, continua desarmado. Tomara que nós
cheguemos a um ponto onde não vai ser preciso estar armado, mas esse é
um país da utopia. O que existe é insegurança e medo”.
O
Ministério da Justiça, diz Regina Miki, é “totalmente contra” qualquer
flexibilização do Estatuto. “Não poderíamos ser a favor de uma coisa que
não tem outro objetivo que não seja tirar a vida”. Rogério Peninha,
entretanto, afirma que o amplo acesso a armas seria uma estratégia de
defesa, não de ataque. “Não queremos acabar com a criminalidade matando
bandido. Queremos nos proteger”.
Por telefone e email, O POVO
entrou em contato, na terça-feira, 12, com a Superintendência da Polícia
Federal no Ceará. Foram colocadas dúvidas como a contagem de armas
registradas e o procedimento para aquisição de armas, assim como a
solicitação de uma entrevista. Até o fechamento desta matéria, não houve
resposta.
Saiba mais
A lei 1o.826/2003, o
Estatuto do Desarmamento, restringe a posse e o uso de armas de fogo às
corporações militares e policiais, empresas de segurança, desportistas,
caçadores e pessoas autorizadas pela Polícia Federal.
O artigo
35 proibia venda de arma de fogo e munição. Mas, para entrar em vigor,
deveria passar por aprovação de referendo popular.
O referendo
ocorreu em 23 de outubro de 2005. A iniciativa era, até então, inédita
no mundo. A pergunta era: “O comércio de armas de fogo e munição deve
ser proibido no Brasil?”. Responderam não 63,94% do eleitorado.
Pela
decisão popular, qualquer pessoa pode ter acesso a arma de fogo, desde
que cumpra série de requisitos. Ainda assim, a decisão final sobre a
concessão do porte é da Polícia Federal.
O projeto de lei
3.722/2012, de autoria do deputado Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC),
reduz de 25 para 21 anos a idade mínima para a aquisição de armas, além
de revogar a necessidade de comprovação de necessidade. Ainda seria
necessário cumprir requisitos como não possuir antecedentes criminais,
avaliação psicológica e curso de tiro.
O que diz o estatuto
Registro:
é obrigatório. O certificado é expedido pela Polícia Federal, renovado a
cada três anos. O proprietário poderá manter a arma de fogo
exclusivamente no interior de sua residência.
Aquisição:
é necessário ter mais de 25 anos, não ter antecedentes criminais,
comprovar que tem emprego, comprovar capacidade técnica e de aptidão
psicológica para o manuseio de arma e declarar necessidade de uma arma.
Comércio: a comercialização tem de ser comunicada às autoridades (Polícia Federal ou Exército, para o caso de armas de uso restrito).
Porte:
proibido em todo o Brasil. A exceção: policiais, guardas municipais,
integrantes das Forças Armadas, funcionários de empresas de segurança e
transporte de valores, desportistas de tiro; pessoas que demonstrarem
sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco
ou de ameaça à integridade física e caçadores. O porte é cassado se o
portador for detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de
substâncias químicas.
Punições: se arma está no
interior da residência, a pena é de 1 a 3 anos de detenção e multa, se
uso não for restrito. Para o porte ilegal, a pena é de dois a quatro
anos e multa. Se é de uso restrito, a pena é de três a seis anos. A pena
para disparo em lugar habitado (sem o cometimento de outro crime, como
roubo) a pena é dois a quatro anos e multa.
Fonte: O Povo
Radio
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