O cardeal e arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, 65 anos,
considerou neste sábado "inadequadas" as preces anti-homofobia e contra a
criminalização sexual feitas na missa de uma igreja na zona leste de
São Paulo no último domingo. O assunto viralizou nas redes sociais, nos
últimos dias, graças à divulgação da foto do panfleto com trecho da
oração. Para o arcebispo, a celebração litúrgica "não deve ser
instrumentalizada para luta ideológica de nenhum tipo".
A
iniciativa foi adotada pela igreja Nossa Senhora do Carmo, onde, domingo
passado, uma oração comunitária pediu aos fieis que rezassem contra "a
ofensiva homofóbica, fundamentalista e histérica" presente no Congresso
Nacional” e a enfrentar situações como essa “com ousadia e serenidade” e
em defesa de “causas libertárias”. A paróquia, contudo, não pertence à
arquidiocese, mas à diocese de São Miguel Paulista, também no leste
paulistano.
Nesse sábado, a assessoria de imprensa de dom Odilo encaminhou nota
na qual também fez questão de enfatizar que o pároco da Nossa Senhora do
Carmo em Itaquera, Paulo Sérgio Bezerra, de 61 anos, “não pertence ao
clero da Arquidiocese de São Paulo” e “não perguntou a opinião do
arcebispo de São Paulo sobre suas iniciativas” [na missa de domingo].
Padre Paulo é pároco no local há 33 anos – a maior parte de seus 35 anos
de ordenação. Em 2013, com a renúncia do então papa Bento 16, após oito
anos no posto, dom Odilo chegou a ser cotado para suceder o pontífice .
O conclave dos cardeais terminou com a escolha do argentino Jorge
Bergoglio, 78 anos, desde então, papa Francisco.
O tipo de
oração considerada “inadequada” pelo arcebispo, além das críticas contra
práticas supostamente homofóbicas por parte do Congresso, tinha ainda
trechos que pediam pelo diálogo sobre as sexualidades, para que isso
levasse “as igrejas cristãs a superar a demonização das relações
afetivas”. A criminalidade sexual – que fez o Brasil liderar o ranking
de assassinatos de homossexuais , ano passado – seria citada outras duas
vezes, pelo fim dela, bem como para que os direitos individuais
pudessem ser resguardados a cada indivíduo.
A reportagem tentou
ouvir dom Odilo sobre o porquê de preces que condenam atitudes de ódio
serem avaliadas como instrumentos “para luta ideológica” a ser evitada
na cerimonia litúrgica. O pedido de entrevista foi negado.
Procurado,
o padre em Itaquera evitou polemizar com o arcebispo. “Respeito o
cardeal de São Paulo”, disse, para completar: “As preces estão dentro de
um contexto de sete domingos de celebrações nos quais o tema geral são
as ‘provocações da vida e as respostas da fé’. Não se trata de nenhuma
ideologia, a não ser buscar na palavra de Deus, nas ciências e na
liturgia as respostas da fé para as provocações da vida, só isso”,
definiu.
“As preces são um momento em que o Espírito sopra onde
quer, são livres, sequer fui eu que as escrevi. Tenho total respeito ao
cardeal, mas estou na Igreja como membro dela e tentando dialogar com as
questões que o mundo coloca, entre as quais, a sexualidade – mas, veja
bem, o mundo coloca, não eu. E as respostas que a fé dá são plurais”,
encerrou o religioso.
Causas "libertárias" envolvem indígenas e LGBT
A
reportagem ouviu esta semana padre Paulo sobre a repercussão que a
oração ganhou na internet e sobre quais seriam, afinal, as “causas
libertárias” que deveriam contrapor a chamada “ofensiva homofóbica”
citadas na oração. De acordo com o religioso, elas vêm sendo
apresentadas uma a cada domingo, no planejamento feito já há um ano. Vão
desde a ameaça sofrida por povos indígenas – tanto por terras
demarcadas quanto por fatores ambientais – a questionamentos sobre
felicidade e corrupção.
“Não estamos desconectados de nada que o
papa Francisco vem pedindo – por exemplo, sobre casais que não dão mais
certo juntos, e, moralmente, devem se separar. Não queremos brigas, mas
precisamos soltar a língua e parar de ter medo de falar aquilo que
precisa ser dito”, justificou, na ocasião.
A cada domingo de
manhã, conforme o padre, o tema expresso na “oração dos fiéis”, durante a
liturgia, é discutido durante a missa com um convidado. Além dos
teólogos e sociólogos que já participaram, as duas últimas celebrações
“libertárias” do ciclo terão o deputado federal Chico Alencar (PSOL)
para falar sobre a crise política e a onda conservadora, neste domingo,
e, no seguinte (5), o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
(MTST), Guilherme Boulos, para falar sobre a importância dos movimentos
sociais como forma de participação política.
A paróquia fica na rua Flôres do Piauí, 170, em Itaquera em São Paulo.
Fonte: Terra
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