As milhões de pessoas que foram às ruas em junho de 2013 não pediram a
aprovação da Lei 12.850, que regulou as delações premiadas. Mas a
mudança legal - parte do pacote aprovado pelo Congresso em resposta aos
protestos - abriu o caminho para que o número de prisões temporárias e
preventivas e os flagrantes de corruptos acusados de desvio de verbas
públicas no País fosse multiplicado por quatro de 2013 para 2016.
Números da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado
(Dicor), da Polícia Federal, mostram que, no ano passado, dez pessoas
foram presas a cada semana por agentes federais em operações de combate
ao desvio de verbas públicas.
Em 2013, antes da aprovação da lei sobre
colaboração premiada, esse número não chegava a três por semana (2,5 em
média). O Estado analisou os dados de 2.325 operações deflagradas pela
PF no País de 1.º de janeiro de 2013 a 31 de março deste ano. Os dados
foram obtidos por meio da Lei de Acesso a Informação. "O marco disso é a
lei de 2013", afirmou a delegada Tânia Prado, presidente do Sindicato
dos Delegados da PF. Para ela, a legislação que emparedou o mundo
político dificilmente passaria hoje no Congresso. "Ela foi aprovada no
contexto da pressão popular. Devem (congressistas) ter achado que era
bom para prender traficante." Em 2013, a PF fez 302 operações no País de
combate a organizações criminosas - desde as envolvidas com crime
comuns, como tráfico de drogas, até as especializadas em delitos
financeiros. Em 2016, esse número aumentou 205%, chegando a 922.
Já no
primeiro ano depois da lei, em 2014, o número de prisões concedidas pela
Justiça e flagrantes nessas operações chegou a 2.798 e somou 4.122 em
2016 - aumento de 771% em comparação com as 473 registradas em 2013.
Para o procurador da República Rodrigo De Grandis, a lei foi "um divisor
de águas no combate à corrupção". "Não havia o procedimento de como se
fazer a colaboração premiada e hoje ela é fundamental." No caso das
operações de combate ao desvio de verbas públicas, as prisões passaram
de 135 (2013) para 524 (2016) - crescimento de 288%. De Grandis diz que,
hoje, o combate à corrupção é uma prioridade na PF e no Ministério
Público Federal (MPF).
Os números da PF mostram que não só as prisões de
corruptos aumentaram, mas também as de todos os demais tipos de
organizações criminosas, como a de traficantes. Ou seja, a lei afetou as
máfias de forma indistinta - a única exceção foi os crimes financeiros.
"É mais difícil obter uma prisão por crime financeiro.
A materialidade
do delito é mais complexa", disse De Grandis. Para ele, "culturalmente",
a tendência é achar que o crime com sangue merece uma resposta mais
severa da sociedade.
"Isso é uma falácia. E está mudando, até no
Supremo." Para o criminalista Roberto Podval, há uma escalada de prisões
preventivas no País nos últimos anos. "Mudou a cultura com relação à
prisão no Judiciário. Saímos da impunidade absoluta para os crimes
econômicos para a punibilidade absoluta, que está nesse momento. A
tendência é que a gente chegue ao meio-termo. Se houve uma banalização
da corrupção, houve também uma banalização das prisões provisórias."
Estadão Conteúdo