Os valores superam os US$ 40 milhões que, segundo ex-executivos, tiveram o repasse acertado em encontro com o hoje presidente, em seu escritório político paulistano.
A propina é ligada, de acordo com a Odebrecht, a um contrato internacional da Petrobras, o PAC-SMS, que envolvia certificados de segurança, saúde e meio ambiente em nove países onde a estatal atua. O valor inicial era de US$ 825 milhões.
De acordo com documentos referentes ao PAC-SMS, apresentados pela Odebrecht, os repasses foram feitos entre julho de 2010 e dezembro de 2011. Os extratos atingem US$ 54 milhões, mas a soma de planilhas anexadas chega a US$ 65 milhões.
Do total, uma pequena parte foi paga em espécie no Brasil, em hotéis em São Paulo, no casos de petistas citados, e em um escritório no centro do Rio, localizado na rua da Quitanda, para os demais.
A maior parte, no entanto, foi repassada a contas de
operadores no exterior.
A Odebrecht reuniu mais de 50 depósitos em offshores fora do
Brasil que vão de US$ 280 mil a US$ 2,3 milhões. Para realizá-los, o setor de
operações estruturadas, área responsável por propina e caixa dois do grupo,
utilizou cinco empresas em paraísos fiscais, quatro delas em Antígua.
Márcio Faria, ex-presidente da Odebrecht Engenharia, disse em
delação que o PMDB negociou propina de 5% do contrato, correspondente a US$ 40
milhões.
Segundo Faria, no encontro com Temer não se falou em valores,
"mas ficou claro que se tratava de propina" relacionada ao contrato,
e não contribuição de campanha.
A reunião, segundo ele, teve a presença de outras pessoas,
como o ex-deputado Eduardo Cunha, e ocorreu quando Temer era presidente do PMDB
e candidato a vice de Dilma Rousseff (PT).
Rogério Araújo, responsável pelo lobby da Odebrecht na
Petrobras, disse que Temer "assentiu" e deu a "bênção" aos
termos do acordo, previamente tratados com Cunha e com o lobista João Augusto
Henriques. Temer confirma o encontro, mas nega a versão sobre propina.
Os delatores relatam que a propina foi renegociada, e o PMDB
teria ficado com 4% e o PT, 1%. Nas delações entregues ao STF (Supremo Tribunal
Federal), a Procuradoria-Geral da República identificou os petistas que teriam
recebido o dinheiro, mas não quem seriam os peemedebistas além de Cunha, preso
em Curitiba.
O senador Humberto Costa (PE), o ex-senador Delcídio do Amaral
e o ex-tesoureiro João Vaccari Neto aparecem como receptores vinculados ao PT,
com os codinomes "Drácula", "Ferrari" e
"Camponês", respectivamente.
Três apelidos não foram identificados: "Mestre",
"Tremito" e "Acelerado".
Um ex-engenheiro da Petrobras, Aluísio Teles, subordinado ao
então diretor da área internacional Jorge Zelada, é apontado como outro
beneficiário de pagamentos.
Segundo depoimentos, o processo de licitação do PAC-SMS foi
feito de forma fraudulenta, com participação de outras construtoras, como a OAS
e a Andrade Gutierrez.
Elas simularam interesse no projeto, possibilitando aumento de
preço por causa da suposta concorrência.
A Procuradoria pediu ao STF abertura de inquérito sobre políticos
envolvidos, mas só solicitou que Humberto Costa e Delcídio fossem ouvidos pela
Polícia Federal.
Nos depoimentos, aparecem pelo menos três intermediários dos
repasses: Ângelo Lauria, ligado ao lobista João Henriques, Rodrigo Duran e
Mario Miranda (da Petrobras). O comportamento de Lauria levou a empreiteira a
mudar o sistema de entrega.
Conforme relato do delator César Ramos, o operador apareceu um
dia dizendo claramente que tinha vindo "pegar o dinheiro da
Odebrecht", sem tentar disfarçar a operação por meio de códigos. A frase
foi comunicada à construtora, que disse que isso não podia se repetir.
OUTRO LADO
A assessoria de Michel Temer afirmou que o presidente
"jamais tratou de valores com o senhor Márcio Faria" e que "a
narrativa divulgada não corresponde aos fatos e está baseada em uma mentira
absoluta". "O que realmente ocorreu foi que, em 2010, em São Paulo,
Faria foi levado ao presidente pelo então deputado Eduardo Cunha. A conversa,
rápida e superficial, não versou sobre valores ou contratos na Petrobras. E
isso já foi esclarecido anteriormente, quando da divulgação dessa suposta
reunião".
Temer "contesta de forma categórica" o envolvimento
de seu nome em negócios escusos e diz que nunca atuou em defesa de interesses
particulares na Petrobras, nem defendeu pagamento de valores indevidos a
terceiros.
A defesa do ex-deputado Eduardo Cunha classificou a acusação
como "absurda", e "inventada por um concerto de delatores e, não
por acaso, não vem acompanhada da mais mínima prova".
O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que nunca se relacionou
com qualquer pessoa sobre o PAC-SMS e que o próprio delator da Odebrecht
relatou que jamais teve contato com ele.
A defesa de Delcídio do Amaral afirma que os fatos relatados
pelos delatores são "mentira".
A defesa de Augusto Henriques negou "qualquer influência
ilícita em negócios envolvendo a Petrobras".
Folha de São Paulo
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