Com uma base
parlamentar modesta e instável, o Palácio do Planalto corre o risco de ficar
sem recursos para pagar subsídios e benefícios a idosos carentes e pessoas com
deficiência (BPC).
Para
contornar esse grave problema de caixa, a equipe econômica do ministro Paulo
Guedes passou a articular a aprovação do projeto de lei que autoriza o governo
a gastar R$ 248 bilhões com recursos a serem obtidos com títulos do Tesouro
Nacional.
É a primeira
vez que o Poder Executivo precisará desse tipo de aval do Congresso Nacional
para realizar despesas como as transferências assistenciais aos mais pobres.
A chamada
“regra de ouro” impede o governo federal de se endividar para pagar despesas
correntes, como salários, Previdência Social e benefícios assistenciais.
Guedes pediu
ao Congresso para que, em 2019, haja uma exceção a essa limitação. Por ser um
caso incomum, o governo federal terá de obter 257 votos na Câmara dos Deputados
e 41 votos no Senado depois que o projeto sair da CMO (Comissão Mista de
Orçamento), onde está parado.
O governo,
porém, deve sofrer uma derrota. Relator da proposta na comissão, o deputado
Hildo Rocha (MDB-MA) informou à Folha que deve excluir a autorização para que
Guedes use títulos públicos para pagar subsídios.
Se essa ideia
prevalecer no Congresso, a equipe econômica não teria, a partir de julho, mais
recursos para programas federais.
Estariam em
risco o Pronaf (programa de fortalecimento para agricultura familiar), o Proex
(financiamento às exportações), o PSI (programa de sustentação do investimento)
e também operações de investimento rural e de custeio agropecuário.
“Não tem
sentido nenhum aumentar esses gastos se temos um déficit tão grande, que temos
de emitir títulos do Tesouro para pagar despesas básicas, como o BPC”, disse
Rocha.
Vincular
despesas como BPC, Previdência, Bolsa Família e subsídios à autorização pedida
ao Congresso foi uma decisão do governo do ex-presidente Michel Temer (MDB),
durante a elaboração do Orçamento de 2019.
A antiga
gestão acreditava que quem fosse eleito não teria dificuldade em receber o
sinal verde dos parlamentares para conseguir recursos destinados a essas áreas
sociais.
O dinheiro
teria então de ser usado para esses setores, cumprindo o previsto no Orçamento
e no projeto que está no Congresso.
Para tentar
garantir que o projeto seja aprovado até julho, secretários de Guedes começaram
nesta semana a entrar em contato com o relator —duas semanas depois de o
deputado assumir a função. O prazo para a área econômica, no entanto, é curto.
Desarticulado
no Congresso, o governo Bolsonaro depende do aval dos parlamentares para que, a
partir de julho, não interrompa o pagamento do BPC, benefício assistencial a
idosos em condições miseráveis e pessoas deficientes.
Segundo
técnicos da Câmara, se o governo fizer, no segundo semestre, a transferência
aos beneficiários sem ter a autorização do Congresso, o presidente Jair
Bolsonaro (PSL) poderá cometer crime de responsabilidade.
Nos
bastidores, deputados dizem não acreditar que interlocutores do Palácio do
Planalto consigam aprovar o projeto de lei até junho.
A oposição já
prepara um pacote para atrasar a votação da proposta na CMO, pedindo, por
exemplo, audiências públicas para debater a situação das contas públicas e a
“regra de ouro”.
Depois da
comissão, o projeto ainda terá de passar pelo plenário do Congresso. Por ser um
pedido excepcional, a autorização para esses gastos precisará de maioria
absoluta da Câmara e do Senado, e não apenas maioria dos parlamentares
presentes, o que exige mobilização dos aliados de Bolsonaro.
Outra
dificuldade de Guedes é que a pauta do Congresso está trancada por 23 vetos
presidenciais, que têm prioridade na votação. Bolsonaro precisará de amplo
apoio as Casas para conseguir superar essa situação.
Dos R$ 248
bilhões pedidos no projeto de lei, R$ 201,7 bilhões são para despesas com a
Previdência Social.
A partir de
setembro, o governo não teria mais recursos para benefícios do INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social) se o projeto não for aprovado. O INSS tem 35 milhões
de beneficiários.
Para o BPC,
são R$ 30 bilhões —previstos para os pagamentos a partir de julho. Os R$ 8
bilhões para subsídios são necessários também a partir de julho.
A equipe
econômica afirmou a parlamentares que talvez não precise emitir títulos do
Tesouro Nacional para bancar o valor total das despesas previstas (R$ 248
bilhões).
Uma parte poderia
ser custeada com recursos do Banco Central.
Ainda assim,
de acordo com técnicos da Câmara, o Congresso tem de autorizar os gastos
previstos para o segundo semestre.
Estudo do
Senado aponta que o custo real para pagar as despesas seria ainda maior caso o
governo se endivide para obter os recursos.
Em nota
técnica sobre o projeto enviado por Guedes, técnicos legislativos calculam que
haveria um custo adicional de R$ 23,2 bilhões por ano com os juros se forem
emitidos títulos no valor total de R$ 248 bilhões.
Folhapress