O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) ajuizou uma
Ação Civil Pública (ACP) para que o Governo do Estado seja obrigado a permitir
o retorno das aulas presenciais em todas as instituições de ensino públicas e
privadas, estaduais e municipais, em quaisquer das etapas da Educação Básica.
Esse retorno deve ser de forma híbrida, gradual, segura e facultativa. A ação
foi ajuizada nesta segunda-feira (5) com pedido de antecipação de tutela, para
o Estado permitir a volta das aulas presenciais, em todas as etapas da educação
básica da rede privada e da rede pública de ensino.
A ação civil é baseada na Constituição Federal e no Estatuto
da Criança e do Adolescente. Para o MPRN, a educação deve ser tratada como
atividade essencial, sendo a primeira a retornar e a última a paralisar. E essa
paralisação deve ocorrer apenas em caso de justificada necessidade
sanitária.
Para abertura e funcionamento das escolas da rede privada,
deve haver o cumprimento do que está determinado nos Protocolos Sanitários
vigentes, de modo que as medidas de biossegurança sejam rigorosamente
cumpridas. Em relação à abertura e funcionamento das escolas das redes públicas
estadual e municipais, isso deve ocorrer de acordo com os respectivos Planos de
Retomada de Atividades Escolares Presenciais que contemplem os protocolos
sanitários e pedagógicos, devidamente elaborados, aprovados e publicados pelos
Comitês Setoriais Estadual e Municipais.
Na ação, o MPRN pede que, em caso de eventual necessidade de
suspensão das atividades escolares presenciais nas redes pública e privada da
educação, o Governo do Estado confira tratamento igualitário, abstendo-se de
autorizar apenas a retomada das atividades escolares de forma presencial na
rede privada de ensino, em descompasso com a rede pública de ensino.
No entender do MPRN, o Decreto Estadual 30.458/2021, que
passou a vigorar nesta segunda (5), “estabelece marco diverso para retomada da
mesma atividade e, portanto, com os mesmos riscos epidemiológicos, elegendo
como fator de diferenciação o fato de os estabelecimentos pertencerem à rede
pública ou privada, o que gera discriminação odiosa, acentuando as
desigualdades em vez de reduzi-las, como quer a Constituição Federal”.
Para o MPRN, não se concebe mais retardar a retomada
presencial das atividades das redes estadual e municipais de ensino, visto que
desde março de 2020 os alunos atendidos por essas redes estão sem atividades
escolares presenciais, ou seja, há mais de 1 ano.
Contexto histórico
O Ministério Público do Rio Grande do Norte vem acompanhando a
questão da educação durante a pandemia desde o seu início. O Governo do Estado,
desde março de 2020, vem expedindo decretos estabelecendo obrigações e
restrições, para os setores público e privado, com o objetivo de enfrentar a
situação de emergência da saúde pública. Assim, em 17 de março do ano passado,
foi expedido o Decreto Estadual 29.524, estabelecendo em seu art. 2º a
suspensão das atividades escolares presenciais nas unidades da rede pública e
privada de ensino, no âmbito do ensino infantil, fundamental, médio, superior,
técnico e profissionalizante. Seis meses depois, com a melhora da situação
epidemiológica do Estado, por meio do Decreto 29.989, de 18 de setembro de
2020, foi autorizada a retomada das atividades escolares presenciais da rede
privada de ensino.
Naquela oportunidade, no art. 1º do Decreto, restou
determinada a suspensão das aulas presenciais na rede pública de ensino do Rio
Grande do Norte, no ano de 2020, diante da criação do Comitê de Educação para
Gestão das Ações de combate da Covid-19 no âmbito do Sistema Estadual de Ensino
do Rio Grande do Norte, através do Decreto Estadual nº 29.973, de 9 de setembro
de 2020, com o objetivo de construir diretrizes para orientar as redes de
ensino na elaboração de protocolos e normas para o enfrentamento da crise
sanitária provocada pelo novo coronavírus, com desdobramentos e tomadas de
decisões para a Educação.
Ou seja, o Estado decidiu não reabrir as atividades escolares
presenciais na rede pública de ensino no ano inteiro de 2020 com o fito de construir
e implementar os protocolos sanitários para a reabertura gradual e segura das
escolas da rede pública no ano de 2021. Em 1º de janeiro de 2021, sem qualquer
impedimento normativo para a retomada das aulas de forma presencial na rede
pública, seja do estado ou dos municípios, as escolas públicas em todo o estado
permaneceram fechadas, sem a oferta de atividade presencial, com a previsão de
retomada de alguns municípios no período de março a abril de 2021, tempo
suficiente para concluir a implementação dos protocolos necessários nas
unidades escolares. Ocorre que, diante do aumento de casos de infecção pelo
coronavírus, foi editado o Decreto 30.388, de 5 de março de 2021, suspendendo
as aulas presenciais nas unidades das redes pública estadual e privada de
ensino, excepcionando as escolas e instituições de ensino fundamental das
séries iniciais e do ensino fundamental I (sem fazer distinção da rede pública
e privada).
Com o agravamento da situação epidemiológica no estado, o
decreto seguinte, de nº 30.419, de 17 de março de 2021, suspendeu todas as
atividades presenciais da rede pública e privada de ensino, em seu art. 7º, com
vigência até 2 de abril de 2021, mantendo em funcionamento todos os serviços
considerados essenciais.
Diante desse decreto não ter considerado o serviço de educação
como de natureza essencial, o Ministério Público Estadual expediu, em 31 de
março passado, a Recomendação Conjunta n. 01/2021 ao Estado do Rio Grande do
Norte, representado pela governadora de Estado, para que adote as medidas
legais pertinentes para incluir as atividades/serviços educacionais
presenciais, em todas as etapas da educação básica, das redes de ensino pública
e privada, no rol das atividades/serviços essenciais nos decretos estaduais a
serem expedidos acerca das medidas para o enfrentamento do novo coronavírus no
âmbito do Estado e que confira às atividades educacionais presenciais o mesmo
tratamento normativo em relação aos demais serviços essenciais quando da
aplicação de medidas sanitárias restritivas.
Mesmo após a exposição de argumentos jurídicos e científicos
ao Governo do Estado acerca da necessidade de se corrigir tamanha distorção,
desproporcionalidade e ilegalidade em não considerar a educação como serviço
essencial e impor às atividades educacionais medidas restritivas de
funcionamento enquanto não se impõe medidas tão severas a outros serviços de
natureza essencial. Ainda assim, foi expedido o atual decreto.
Para o MPRN, o decreto estadual em vigor “foi editado em total
descompasso com a Recomendação Ministerial citada. A uma, por não ter
considerado a educação como serviço essencial. A duas, ao ter conferido
tratamento diferenciado ao serviço de educação restringindo-o bem mais do que
outros serviços sequer considerados essenciais, como centro comercial, shopping
center, galeria, lojas, academia, estúdio de pilates, food park, bar,
restaurante, salão de beleza. A três, por ter tratado de forma desigual e
bastante reprovável os alunos da rede pública da rede privada de ensino”.
Ainda no entender do MPRN, o Estado e todos os Municípios
precisam, urgentemente, discutir o retorno às aulas das escolas públicas, pois
essas são as mais afetadas durante o curso da pandemia. As crianças e
adolescentes inseridas em famílias socioeconomicamente vulneráveis já foram
bastante impactados pela suspensão das aulas presenciais há mais de um ano,
aspecto que com certeza intensifica a desigualdade social no RN. O atual
decreto estadual é ainda eivado de inconstitucionalidade por violar o
princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola
e da garantia do padrão de qualidade.
Clique aqui e confira a íntegra da
ACP.
MPRN