A característica mais marcante da chikungunya são as fortes
dores nas articulações, que podem persistir por muito tempo depois da fase
aguda da infecção. Lesões vasculares, inchaço, perda de sensibilidade e até queda
de cabelo são sequelas que já foram identificadas na fase crônica da
doença. Agora, pesquisadores brasileiros estão monitorando as complicações
oculares que o vírus transmitido pelo Aedes aegypti pode desencadear.
Resultados
preliminares de um estudo conduzido em Feira de Santana, na Bahia, indicam que
mais da metade dos pacientes com chikungunya avaliados apresentam alterações
oculares que levaram, em alguns casos, à perda parcial ou total da visão de
forma irreversível.
O
oftalmologista Hermelino de Oliveira Neto, professor da Universidade Estadual
de Feira de Santana (UEFS) e coordenador do Hospital de olhos de Feira de
Santana (Clihon), está à frente do projeto, feito em parceria com pesquisadores
da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp).
A
literatura médica já apontava para a possibilidade de a chikungunya afetar a
saúde ocular. Um artigo de 2007 publicado na revista “Clinical Sciences”
descreveu casos de neurite óptica, um tipo de inflamação do nervo óptico, em
pacientes infectados pelo vírus na Índia. Mas o número elevado de casos
registrados no Nordeste do Brasil permitiu fortalecer as evidências dessa
associação.
Feira de Santana foi uma das primeiras cidades brasileiras a
registrar casos de chikungunya em 2014. Uma iniciativa da Fiocruz e da UEFS
passou a acompanhar pacientes com chikungunya na cidade para verificar os
efeitos de longo prazo da doença. A equipe de Hermelino passou a fazer exames
oftalmológicos nos pacientes que já eram acompanhados pelo projeto. “A gente
criou um consultório itinerante e montou ao lado da sala de atendimento desse
grupo”, conta o oftalmologista.
O
atendimento oftalmológico se dá uma vez por mês e começou em novembro. Até o
momento, foram avaliados 87 olhos de 44 pacientes com exames positivos para
chikungunya.
"É importante termos o conhecimento de que essa doença cega. Tenho uma
paciente que está cega por uma doença que poderia ser evitada", Hermelino
de Oliveira Neto, oftalmologista.
Do total de pacientes avaliados, 75% relatou queixas
oculares, desde as mais simples até as mais intensas, e 54% apresentou lesão
nos olhos. Em 5% dos pacientes, foi detectada uma lesão importante na retina e
no nervo ótico que levou a uma baixa de visão severa e irreversível.
É importante termos o conhecimento de que essa doença cega. Tenho
uma paciente que está cega por uma doença que poderia ser evitada”, diz
Hermelino. Para ele, os resultados reforçam a importância de se prevenir a
proliferação da doença e de estudar novas formas de intervenção que possam
diminuir os riscos de complicação na fase aguda da doença.
Até
o momento, ainda não está claro como o vírus atua para afetar a visão.
Hermelino explica que existe uma suspeita de que o vírus agrida os olhos
diretamente. Outra suspeita é que se trata de um fenômeno autoimune: que os
anticorpos produzidos para combater o vírus levariam a um processo inflamatório
intenso que afetaria os olhos.
Em
2016, o Brasil registrou 271.824
casos de chikungunya, o que representa um aumento de 606% em relação a 2015.
G1/ Bem Estar