O vice-presidente Michel Temer encaminhou na noite desta
segunda-feira uma carta pessoal à presidente Dilma Rousseff onde expõe
sua posição sobre o momento político que o país atravessa marcado pelo
pedido de impeachment contra ela. Temer contradiz a declaração da
presidente, que no início da tarde havia afirmado confiar nele. Temer
encerra a missiva, obtida pelo GLOBO, rebatendo especificamente isso:
“Sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá
amanhã”. E enumera uma série de fatos para provar essa declaração.
A
amigos, Temer disse que enviou a carta para não precisar se encontrar
pessoalmente com a presidente Dilma e ser vítima novamente de uma
“arapuca” armada pelos ministros que tentam associá-lo à defesa do
governo contra o impeachment. Apesar do tom duro, peemedebistas dizem
que a carta não significa ainda um rompimento. Mas é quase isso.
O vice-presidente conversou com o GLOBO e mostrou-se incomodado com a divulgação da carta.
—
Escrevi uma carta confidencial e pessoal à presidente da República.
Tive o cuidado de mandar pessoalmente a minha chefe de gabinete
entregá-la. Mais uma vez avaliei mal. Desembarquei em Brasília agora à
noite e me surpreendi com o fato gravíssimo de o palácio ter divulgado
uma carta confidencial. Eu já tinha me decepcionado quando os ministros
Edinho Silva (Comunicação Social) e Jaques Wagner (Casa Civil)
divulgaram versões equivocadas do meu último encontro com a presidente,
me deixando mal jurídica e politicamente.
Segundo o
vice-presidente, Jaques Wagner divulgou a informação errônea de que ele
não via lastro jurídico no impeachment. Temer disse que a decisão de
Cunha tem lastro jurídico.
— Eu havia sido comunicado pelo
Eduardo Cunha que ele acolheria o pedido de impeachment. Reconheci seu
direito de fazê-lo e depois o ministro Jaques Wagner colocou na minha
boca a afirmação de que a decisão não tinha lastro jurídico.
Constrangido, tive que desmenti-lo. O acolhimento tem sim lastro
jurídico.
O vice-presidente enviou a mensagem antes de embarcar
em São Paulo em um jatinho da FAB para Brasília. Apesar de Dilma ter
dito à imprensa que tem confiança integral em Temer e que ele sempre lhe
foi fiel, a desconfiança clara por parte da petista vem desde o início
de agosto, quando Temer pregou o surgimento de “alguém” capaz de
unificar o país.
— Não tem jeito. Ele vai ser chamado de
conspirador o tempo todo. Então, ao fazer a carta, ele quer mostrar que
sempre colaborou, sempre ajudou o governo. E queria demonstrar que ela
(Dilma) nunca demostrou essa confiança em todos esses episódios —
explica um interlocutor do vice-presidente.
UM ROSÁRIO DE LAMENTAÇÕESNa
carta, Temer enumera uma série de motivos que demonstram que ele nunca
recebeu a confiança da presidente. O rosário de problemas vinha desde a
escolha de seu nome para vice na chapa presidencial, em 2010, e seria
exposto na próxima conversa privada entre os dois. Ontem à tarde, no
entanto, reunido com o ex-ministro Moreira Franco, o vice desistiu do
encontro privado e resolveu enviar o texto.
O texto se inicia com uma citação em latim — Verba
volant, scripta manent
— que significa “As palavras voam, mas o escrito fica”. O
vice-presidente explica então que escreve um “desabafo que já deveria
ter feito há muito tempo”.
Em uma série de mensagens publicadas
em uma rede social da vice-presidência, horas após o envio da carta, a
assessoria do vice-presidente disse que Temer enviou carta em caráter
pessoal, não lhe deu publicidade e “em face da confidencialidade,
surpreendeu-se com sua divulgação”. A assessoria faz então
esclarecimentos:
“Diante da informação de que a presidente o
procuraria para conversar, Michel Temer resolveu apontar por escrito
fatores reveladores da desconfiança que o governo tem em relação a ele e
ao PMDB. Ele rememorou fatos ocorridos nestes últimos cinco anos mas
somente sob a ótica da debate da confiança que deve permear a relação
entre agentes públicos responsáveis pelo país”.
Segundo a vice-presidência, não se trata de uma ruptura, mas de uma defesa da “reunificação” do país:
“Não
propôs rompimento entre partidos ou com o governo. Exortou, pelo
contrário, a reunificação do país, como já o tem feito em
pronunciamentos anteriores. E manterá a discussão pessoal privada no
campo privado”.
Horas antes de embarcar para Brasília, o
vice-presidente apresentou em São Paulo a uma plateia de cerca de 150
empresários o programa de governo formulado pelo PMDB para que o Brasil
saia da crise. Em um evento mensal da Federação do Comércio de São Paulo
(Fecomércio) para o qual já estava convidado antes da deflagração do
impeachment, Temer falou por cerca de meia hora sobre as propostas de
“Uma ponte para o Futuro”. Procurado, o Palácio do Planalto não qui se
manifestar sobre a carta de Temer.
Fonte: EXTRA